Consegue imaginar aquelas cenas tanto cómicas como românticas dos filmes que nos apresentam uma mamã a acordar o marido a meio da noite (“querido, chegou a hora!”).
E uma movimentação verdadeiramente histérica no hospital, procurando antecipar um parto em pleno corredor da maternidade? Pois eu confesso… o meu parto foi assim!
“Amor… estou cheia de dores de barriga…”. Foi assim que acordei o meu marido, às 7 horas da manhã do dia 21 de Outubro de 2002. Estava, no entanto, convicta de que se devia tratar de mais um ‘falso alarme’ e, se não fosse a insistência de um futuro pai ansioso, confesso que me tinha deixado ficar na cama a tentar perceber a origem daquelas dores.
A partir dali foi uma correria, comigo a ser quase que obrigada a acelerar o passo. Tomar banho, arranjar a minha filha Mafalda e atravessar a A5 em direcção a Lisboa, em plena hora de ponta. “Tens a certeza de que não queres que eu vá pela berma?”, perguntava-me o meu marido, ansioso, enquanto eu me esquecia das contracções e procurava entreter a minha filha, muito pouco acostumada a despertar tão cedo.
Chegamos a Lisboa, deixei a Mafalda em casa dos meus pais, e dirigi-me ao hospital. Por sorte, encontrei o meu obstetra – que apenas faz partos naquela maternidade e tinha ido dar alta a uma doente – que, depois de me observar, me mandou para casa, não deixando de me dar um alerta entre sorrisos “vai para casa mas pode ser que daqui a duas horas esteja de volta já em trabalho de parto”!
As horas que se seguiram foram curtas para tudo o que eu tinha de fazer (não fosse a Matilde querer realmente nascer naquele dia)… E a meio da tarde, depois de ter conseguido realizar tudo o que estava pendente, liguei ao meu obstetra: “as contracções já estão de três em três minutos!”. A resposta? “Vá imediatamente para o hospital. Já vou ter consigo”.
Foi assim que fui internada às 16h40. Instalaram-me num quarto individual bastante agradável, repetiram-se os rituais que eu já conhecia do meu primeiro parto, e resolvi preparar-me para algumas horas de espera, vendo televisão, enviando mensagens pelo telemóvel e conversando animadamente com o meu marido, que esteve sempre ao meu lado.
Por volta das 17h30 apareceu aquele que seria supostamente o meu ‘salvador da pátria’ – o médico anestesista que me iria administrar a epidural (e logo a mim que, depois de ter tido uma primeira filhota de 4,070 kg em parto normal, adoraria experimentar um parto sem dor)! Infelizmente tive azar e a epidural não pegou, deixando-me novamente entregue a contracções tão ritmadas quanto dolorosas…
“Tem cinco dedos de dilatação. Vou telefonar ao seu médico para vir ter consigo”, disse-me a enfermeira, por volta das 19h30. Nessa altura já eu tentava desesperadamente controlar as dores, praticando as respirações que aprendera nas aulas de preparação para o parto, e evitando um grito mais violento ao meu marido, quando ele tentava distrair-me com alguma brincadeira.
Em menos de 15 minutos supliquei (mesmo!) ao meu marido que voltasse a chamar a enfermeira: “o bebé quer nascer”… Ela entrou no quarto desconfiada e tranquila. Fez-me o toque e soltou de imediato um berro: “enfermeiras, auxiliares, venham ajudar-me. Temos de levar urgentemente esta mãe para a sala de partos. O bebé já tem a cabeça a sair!”.
Depois foi uma verdadeira maratona pelo corredor que separava o meu quarto da sala de partos, comigo a ser empurrada na cama por duas auxiliares, o meu marido a trazer o berço do bebé (que nem teve tempo de ser previamente aquecido), médicos que eu desconhecia a vestirem as suas batas, e pessoas – muitas pessoas – a saírem da sala de espera para verem o que se passava. Para completar o filme, ouço de repente o meu médico aos berros “eu estou aqui, eu estou aqui!”!
Em segundos, eu estava na sala de partos. O meu médico olhava para mim e dizia que eu estava a fazer muito bem a força que devia fazer. “Mas como? Eu estou é a fazer cócó!”, dizia-lhe eu (acreditem que isto não me aconteceu com a minha primeira filha, mas a verdade é que eu tinha a nítida sensação de que estava a evacuar!)! Uma enfermeira e um médico diziam que não estava a fazer cocó, mas que a sensação era a mesma e que… a Matilde estava mesmo a sair. Um, dois, três empurrões (comigo aos gritos: “ajudem-me, ajudem-me!”) e a minha linda filha estava cá fora! Eram 20h11 minutos.
Peguei na Matilde e quis dar-lhe de mamar. “Nunca mais tenho um filho, estas duas já chegam”. Uma enfermeira afagou-me o cabelo e sorriu: “vai ter mais, sim! Ainda nos vamos voltar a encontrar!”. E há-de ser verdade, se Deus quiser. Daqui a uns anos, com ou sem dor, hei-de voltar a experimentar mais um ou dois partos que, quem sabe, poderão dar um diferente enlace ao filme da minha vida!